terça-feira, 10 de março de 2015

De todo mundo

Promíscuo. Acepções: adjetivo
1) Constituído de elementos heterogêneos juntados desordenadamente; misturado, mesclado, embaralhado.
2) Misturado ou compartilhado com elementos de conduta reprovável ou suspeita
3) Que ocorre por acaso; fortuito, eventual, ocasional
4) Regionalismo: Brasil. Que tem relações sexuais com inúmeros parceiros e sem selecionar muito (diz-se de indivíduo)

Promiscuidade. Acepções: substantivo feminino
1) Característica do que é promíscuo.
2) Mistura confusa, desordenada.
3) Relacionamento sexual não monogâmico, com muitos parceiros diferentes.
4) Regionalismo: Brasil. Convivência muito próxima com pessoas de todo tipo.
5) Rubrica: sociologia. Relacionamento sexual não regido por leis ou regras. (ambas as definições são do Dicionário Houaiss)

Já dizia Machado de Assis que "a melhor definição de amor não vale o beijo de moça enamorada". Em relação à promiscuidade, talvez seja a mesma coisa - exagerando um pouco na comparação. Afinal de contas, somos mesmo todos promíscuos ou isso é coisa da cabeça de falsos moralistas e coisas do tipo? O caso é que, em tempos pós-AIDS e afins, esse tipo de comportamento virou algo pior do que palavrão. Não é raro encontrar quem já tenha sido tachado – ou melhor, acusado – de ser promíscuo.

“Fiquei sabendo por um rolo meu que um cara que ele conhecia falou horrores de mim quando soube que a gente estava ficando. Entre outras coisas fui acusado de ser promíscuo, mas com uma carga na palavra que mais parecia que eu era o anticristo. Concordo que não tenho um comportamento celibatário, mas daí a ser acusado de promíscuo eu acho um pouco demais, até porque quem me acusou já teve (ou ainda tem) um comportamento pior do que o meu” diz o empresário Leonardo, 27 anos, morador do Vale do Paraíba. Ele ainda questiona: “Todo gay já teve uma fase de pura e simplesmente ‘fast-fodas’, em que não quer saber de relacionamento sério, quando você só quer curtir a vida. Ou seja, se for analisar por este ângulo, todo mundo já teve um passado promíscuo, ainda que atualmente não seja. Mas quem é mais errado, então? Eu, que já curti muito mas quando namoro sou fiel, ou aqueles que dizem namorar mas caem na farra assim que o namorado vai pra casa”?

O primeiro ponto a ser discutido é que o conceito de promiscuidade é relativo. Quem transa com 10 pessoas numa noite e conhece alguém que transa com 30, logicamente vai achar que promíscuo é o outro – ainda que também possa ser considerado promíscuo. Ao mesmo tempo, um virgem tímido pode pensar da mesma maneira em relação a alguém que, numa noite, beijou mais de uma boca. Daí a dificuldade de se definir parâmetros em relação ao tema. Mas, em se tratando do Ministério da Saúde, podemos dizer que toda a humanidade está condenada: segundo o órgão, “qualquer pessoa com mais de três parceiros por ano é considerada ‘promíscua’, independentemente da orientação sexual. Ninguém é mais ou menos promíscuo por ser homo ou heterossexual”.

Mas se o próprio Ministério da Saúde afirma que não há diferenciação entre o grau de promiscuidade baseando-se apenas na orientação sexual da pessoa, por que a fama de promíscuos é maior quando se trata de homossexuais? Chegamos a um ponto em que, novamente, não há consenso, nem mesmo entre os gays. Fernando, analista de sistemas mineiro, se contradiz na própria resposta: “Essa afirmação generalizada que gays são promíscuos é mais vinculada ao homem, em geral, mas não acredito que todos são. A razão da fama... Bom, a maior parte dos homens é mesmo”. O jornalista paulistano William, de 41 anos, já vê a coisa por outro ângulo: “Não concordo com a tese de que todo gay é promíscuo. Eu, por exemplo, sou evangélico e acredito numa relação estável entre dois caras, além de conhecer pessoas assim”.

Mas então o que seria o ponto de partida dessa ideia generalizada em relação à promiscuidade gay? “O fato de estar sempre com parceiros diferentes”, diz William. “O comportamento dos gays na própria Parada... Acho que paquerar é uma coisa, mas tem gente que tira quase toda a roupa, coloca o pinto pra fora – e lá tem também famílias, crianças, etc. Acho que o gay tinha que pensar numa maneira de conseguir o respeito da sociedade para sermos vistos como pessoas, não como animais”. Mas, comportamentos em eventos à parte, o que explica a constante troca de parceiros? “A busca pela pessoa ideal. Simples assim”, afirma Fernando que, aos 33 anos, nem tem ideia de quantos parceiros já teve. E quando a busca não chega ao fim? “É o meu caso... Eu sou mesmo promíscuo, confirmo. Mas quando estou com alguém, sou fiel – e apenas aquele um me basta”.

O fato é que a fama de promíscuo permeia tanto o meio gay que mesmo quem não tem esse tipo de comportamento acaba se considerando como tal. É o caso do carioca Juliano: aos 36 anos, está casado há nove com o mesmo homem, sempre fiel. “Hoje em dia, por ter alguém de quem eu realmente gosto, não transo com outros caras, até por uma questão de respeito. Mas eu acho que sou de índole promíscua sim, sei lá. Antes de casar fiquei com 15 caras diferentes, isso num período de seis meses”, conta. Quinze parceiros em seis meses? A média é de 2,5 homens por mês. Numa época em que muita gente fica com pelo menos o dobro disso numa única noite, Juliano ainda acha que foi promíscuo?

“Ah, ter ficado com 15 pessoas diferentes em seis meses é promiscuidade, sim. Ok, lá na praia eu já vi o povo fazer mais que isso num dia (risos), mas eu acho que meu comportamento pré-casamento entra na definição de promiscuidade, e a maioria de meus amigos solteiros acho que é promíscua também”. O médico até arrisca uma explicação pro fato... “É notório que o desejo sexual é diferente por um parceiro novo, comparando a um parceiro a que você já está acostumado. Não que seja melhor ou pior, mas a ‘novidade’ do outro corpo, da descoberta, já não existe mais no seu parceiro de todo dia”.

Mesmo com toda essa argumentação, William faz uma ressalva: “A fama de promíscuos é dos gays sim, mas eu não acho que seja exclusividade. Como esse tipo de preconceito vem de longe, continua se espalhando – mas eu acredito que hoje a sociedade, como um todo, caminha neste sentido. A promiscuidade não é só no mundo gay, é no geral – os valores estão invertidos, as pessoas estão muito livres, muito soltas, sem regras de comportamento. A evolução tecnológica mundial não acompanhou o básico – a evolução comportamental”.

Ainda assim, ainda é possível especular sobre outras causas da promiscuidade. No meio hetero, sim, pode se tratar de uma tendência social (basta avaliar as danças de carnaval, bailes funk e afins). Já no meio gay, a promiscuidade pode ter se originado – em parte – por culpa da própria sociedade. Certo, existe o componente sexual da coisa; mas existe também a dificuldade de se relacionar entre os gays – como manter um relacionamento, como executar a manutenção dessa relação se a sociedade não aprova? Chega a ser irônico: a mesma sociedade que rotula os gays como promíscuos não aceita quando dois homens querem “abandonar” a promiscuidade – ou seja, casar e morar juntos, como outro casal qualquer.

E você? É promíscuo? ;-)

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Agora vai! (ou: por que um blog?, ou ainda: por que retomar um blog?)

E mais, por que um blog gay, sendo que já existem tantos por aí?

Talvez - basicamente - porque eu não me sinta representado enquanto homem gay pela maioria dos blogs que existem por aí. Nada contra, leio alguns e me divirto muito, mas eu acho que na vida gay pode e deve existir mais do que baladas, ferveções, música tribal, discussões fashion e polêmicas sobre o último disco da Madonna, da Lady Gaga ou a volta da Cher.

Isso quer dizer que sou contra toda a cena gay? Não. Muito pelo contrário. Antes que já comecem a surgir polêmicas, quero deixar bem claro que sou a favor, até frequento ocasionalmente (apesar de não fazer disso um ritual). Mas acho que a bandeira da diversidade, tão alardeada por aí, acaba não sendo lembrada nessas horas. Nem mesmo nas novas revistas direcionadas ao mercado gay, em que apesar das tentativas ainda acaba se caindo na velha fórmula estereotipada - alguém explica por que todo gay tem que andar na moda, não ficar em casa nos fins de semana de absolutamente jeito nenhum, ouvir só música bate-estaca, fazer planos só para viagens internacionais, comprar roupas que custem no mínimo 500 reais a peça e passar 364 dias do ano sonhando com o dia da Parada em São Paulo???

Por conta disso - e outros fatores que devem ser abordados aqui mais pro futuro - surgiu a idéia deste blog, há cerca de alguns anos. Demorei tudo isso pra colocar em prática um pouco por falta de vergonha na cara, mesmo, e outro tanto pensando e repensando na minha mente o formato. Não vai ser uma coisa "diário", nem repetição de notícias já vistas por aí, nem noite/balada gay. Pra isso já existem sites e blogs aos milhões aí, que fazem isto bem melhor do que eu, tenho certeza. Talvez eu até reproduza alguma coisa que esteja muito em evidência, mas de uma forma geral o foco aqui vai ser diferente. Quão diferente, só o tempo dirá. Mas digamos que em vez de lugares e tendências, eu prefira pessoas e comportamentos. Também não estou interessado em verdades absolutas. Prefiro questionar, instigar, fazer pensar. A verdade, afinal de contas, é diferente para cada um.

Mas falemos um pouco sobre mim: sou um cara com quase 40 anos, jornalista por formação e nem-tão-nerd-de-plantão por vocação, com uma porta do armário arrombada e a outra ainda por abrir (e confortável com isso), acredito em militância feita de maneira não xiita. Curto balada sem exageros, viciado em doce e churrasco, malho o suficiente pra poder continuar comendo sem neurose. Vermelho, azul e preto são as cores favoritas. Não tenho Facebook, Myspace ou Twitter. Meço mais de 1,80m, calço 43.

Como isto também é um blog, já deixo avisado: os comentários são moderados - porque não, isto não é uma democracia, muito menos para os covardes da net que se escondem atrás do anonimato para ofender (ser anônimo para comentar com inteligência, pode. Também não vou ser tão inflexível assim). Algumas vezes vou ser um tanto quanto ingênuo, outras vezes vou ser escroto a não mais poder. E que atire a primeira pedra quem nunca age da mesma maneira na vida real. Ninguém é só santo ou puro demônio o tempo todo.

Isto posto, seja bem-vindo (ou bem-vinda)!
Aqui se inicia mais uma relação perigosa...

;-)

Update: No fim das contas, após tanto tempo, voltei. Por quê? Basicamente, acho que chegou a hora de eu retomar isso aqui como "projeto" - além de exercitar o raciocínio e a escrita de outras formas, faz com que eu (oh, doce ilusão) me sinta útil.

Meu estilo não mudou, nem vai mudar. Os posts continuarão se alternando entre coisas pra se pensar, reportagens (sim, eu perco meu tempo pensando num assunto, conversando com amigos e fazendo questionamentos pra escrever alguns textos), e pensamentos sobre o momento em que estou vivendo. Alguns dos posts antigos serão republicados, outros não, e novos temas deverão aparecer por aqui. Por falar nisso, sugestões de assuntos são sempre bem-vindas!

Acho que também, de certa maneira, o fim de algumas publicações gays que não tratavam homossexuais como imbecis que só pensam em pinto e bunda (e molequinhos recém-saídos da adolescência, apesar de algumas escorregadas em certas matérias), além da falta de um site que me atraia o interesse, me estimulou a voltar a discutir alguns assuntos aqui –  já que, pelo visto, não serão em lugar nenhum. Não quero e não vou acreditar que, por ser um homem que gosta de outro homem, eu não possa ter outros interesses na vida que não os já citados acima. Já me acusaram até mesmo de homofobia internalizada, mas sinceramente: o gay retratado na mídia, inclusive na mídia gay, não me representa.